quinta-feira, 23 de agosto de 2012

Uma pequena grande vitória da luta pela moradia: professor Filipe é absolvido em sentença surpreendente


         O professor de História da rede estadual e apoio de ocupações sem-teto Filipe Proença foi absolvido por unanimidade em julgamento de segunda instância na 9ª Vara criminal do Rio de Janeiro.O professor foi preso em 13 de dezembro de 2010 ao participar do ato de apoio à Ocupação" Guerreiros Urbanos" em imóvel abandonado há mais de quinze anos pelo INSS na rua Mém de Sá, 234. A desocupação ocorreu de maneira irregular, sem ordem de despejo e por órgão incompetente, pois o imóvel era federal e o despejo foi realizado pela Polícia Militar (estadual). Filipe era acusado do crime de resistência e mesmo não sendo identificado como tendo praticado qualquer sorte de ato violento em depoimentos da própria acusação, o professor foi condenado em primeira instância pelo Juiz Eduardo Nobre Maltta, contrariando o próprio pedido de absolvição do Ministério Público.
     Depois de um ato político em frente ao fórum federal  contando com apoio de militantes de movimentos e com a presença de alunos do professor, finalmente temos um desfecho favorável neste caso. O júiz relator Paulo Alberto Jorge efetuou uma sentença que gera uma jurisprudência bastante favorável para ser usada pelos movimentos sociais em futuros despejos e arbitrariedades policiais .Ele reconhece os movimentos sociais de luta pelo direito a moradia, bem como a necessidade de ordem legal para efetuar despejos, ainda criticando a atuação da Polícia Militar nesse caso e em outros. Segue a seguir alguns trechos da sentença e em anexo a sentença completa.
Se morar é um direito, ocupar é um dever!

"Da maneira como agiram, os policiais usurparam da administração
pública o pleno exercício de seu poder discricionário para optar pela forma mais
adequada de solução da situação, se pela negociação, imposição da auto-executoriedade
de seus atos ou pela adoção de medida judicial. Usurparam também a prerrogativa do
Poder Judiciário decidir pelo melhor Direito aplicável, e pela maneira mais adequada de
impô-lo. Como tantos outros, o conflito acabou sendo resolvido por iniciativa dos
agentes repressores do Estado, que a partir das informações que tomaram
unilateralmente e sem maiores questionamentos, decidiram tratar-se de invasão ilegal de
prédio público e que os invasores deveriam ser retirados à força, sem maiores delongas."
"Neste contexto, é evidente que a solução negociada do conflito não se
impunha apenas por uma questão de princípio, mas também por ser a negociação um
claro objetivo dos participantes do movimento. Estava em curso um movimento
político-social e assim deveria ser tratado"
"A ilegitimidade da ordem de desocupação feita pela Polícia Militar no
presente caso fica ainda mais evidente se compararmos sua atuação em casos, por
exemplo, das inúmeras áreas públicas desta cidade ocupadas por bares e restaurantes
que, sem cerimônia, avançam seus estabelecimentos sobre calçadas com mesas e
“puxadinhos”. Há algum registro de membros da Corporação, da mesma forma
autônoma com que agiram no presente caso, sem esteio em ato administrativo ou
judicial, terem promovido a reintegração de posse destas áreas porque algum cidadão os convocou pelo 190? Teria o Batalhão de Choque da PM do Rio de Janeiro promovido
por sua conta, somente a partir de denúncia de algum cidadão, o fechamento de algum
estabelecimento comercial instalado em área pública de proteção ambiental sem autorização ? 
É claro que nestes casos a PM age apenas no cumprimento de ordem
de autoridade administrativa ou judicial, a quem incumbe decidir quanto ao efetivo
descumprimento de posturas e esbulho possessório. Instâncias em que as soluções e os
interesses em conflito podem ser melhor aquilatados de forma a se obter a máxima
legitimidade da decisão de força que se mostre necessária e proporcional."

"Qual a justificativa, senão a cultura da repressão militarizada a
movimentos sociais, para no caso presente ter a PM agido de forma diversa, ela própria
apurando, decidindo, emitindo e cumprindo com força a ordem de reintegração de posse do prédio invadido ?
Não à toa, recentemente o Conselho de Direitos Humanos da ONU
sugeriu o fim da Polícia Militar no Brasil.
Por isso, não se pode ter como legítima a conduta da Polícia Militar no
presente caso, de agir por conta própria e promover à força a suposta reintegração de
posse de bem público ocupado com claras motivações políticas, inseridas em
problemática social de carência de moradias e de acesso a elas pela população menos favorecida"

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